Aquele Violão

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aquele violão
Imagem: Freepik

Estou pensativo esses dias. Quem me conhece, sabe que o faço desde sempre. Ainda me lembro, enquanto criança, ao invés de sair correndo nas brincadeiras de pique ou gude, estava ali falando sobre Deus. Pobre criança à minha frente, ouvindo minhas palavras. Sete anos de idade o menino possuía, número mais do que especial. Logo eu, uma vez expulso da Igreja – única vez expulso de algum lugar? – marcava minha natureza.

Saborear a vida em seus detalhes foi algo que sempre gostei. Para mim, a vida, e seus mistérios, não devem correr. Admirar-se do sagrado, ficando ali um minuto, uma hora, a observar todo o milagre da existência, é o ofício do ser humano: flores na varanda, inesperado à minha frente, uma dança em forma de pessoa ou o contrário, tudo isso me prende. Observo, vejo, inspiro, escrevo. Viver é preciso.

O mundo necessita de mais poesia. Tudo está em um cinza martelo, apesar de ser um apaixonado pelo símbolo que este último, em casamento com outro, representa. O lirismo foi embora, a canção não toca da mesma maneira. Há um chiado no rádio, uma frequência que não sintoniza. Talvez seja loucura minha ouvir o mundo como uma música do James Blunt. Ninguém sabe disso. Sorte a minha.

Mas não vejo muito sentido em seguir em frente simplesmente. Como teimoso que sou, a vida, a música e seus mistérios, precisam, a todo momento, serem revisados. Como em uma correção de prova pela professora, olhar cada detalhe e ver onde repousa o erro, marcam o passo da vida. Como um apaixonado que repete a música para que a lembrança não se esvaia, tão rápido como a rotina, tão frágil como uma bolha de sabão. É como justificar cada lágrima derramada ao longo da jornada, em todo canto em que bateu de frente ao muro. Sei que fez isso também. Estamos juntos. Estamos vivos.

Não sei o propósito de Deus. Nem sei dizer se houve um propósito quando nos criou. Se é verdade que o princípio do Novo Deus é o amor, então, percebo que não houve um motivo. As finalidades residem nas matemáticas, nos planejamentos, nas agendas. Não consigo enxergar Deus anotando que na segunda-feira, dia feio, Ele resolveu criar. Eu não pensei em escrever hoje. Ele também não planejou isso.

Mas amou e resolveu. Precisa de propósito maior? Como onisciente que é, provavelmente já conhecia a música do James Blunt e ouviu: You’re Beautiful. Ninguém resiste àquele início de violão. Impossível não se sucumbir quando o músico britânico diz: minha vida é brilhante. Até imagino Deus, em seu processo autopoético, relembrando o que ainda não aconteceu, e esforçando-se para ouvir da letra da música: você é linda! No instante em que ouve o refrão, como um adolescente pueril, rabisca no seu caderno: que se faça a luz! Na sequência, com o coração acelerado, povoa as sete páginas do livro da vida com aquilo que ficou conhecido como universo. Um sorriso se estampa no semblante de Deus. Um menino beijou. Ele criou. Ao suspeitar de uma lágrima do ouvinte, o oceano transborda e um jardim surge. Ao compreender a música, você nasce. E, ao nascer, coroada que é, a vida expele seu choro e alegria por onde toca essa música: You’re Beautiful!

E segue mais uma vez o violão do Blunt, meus passos em direção ao desconhecido, os mistérios da vida e Deus. E sigo eu, tentando entender…

A música, a vida e seus mistérios.

…e aquele violão…

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