O mundo poderia ser diferente. As pessoas poderiam ser diferentes. A história poderia ser mais de paz do que de guerra. A terra mais azul do que vermelha. Sorrisos poderiam ser mais presentes do que as lágrimas de uma saudade. Deus poderia ser mais ausente e a humanidade mais presente. O abraço mais demorado, o choro nunca apertado e a alegria uma festa permanente. A música poderia ser tocada mais vezes, a tarde nunca escurecer quando és vista aqui, poesia em todo lugar. O dinheiro poderia ser só o troco do pão, o pão nunca faltar, e a ternura ser uma fartura também. Assim escrevo aqui.
O trabalho não deveria ser um cansaço, antes um traço, de um destino em que todos partilham da comunhão. Ninguém precisa chegar em primeiro lugar. Porém, ninguém deve ficar por último. O dia a dia de um labor não pode ser dor, escravidão, instrumento do capital, um colorido preto e branco, cinza sem vida. O trabalho é o momento de trocas, de experiências, ciência, piadas sem sentido e conselho amigo. É um lugar sagrado, palácio de nossos antepassados, que sangraram por ele ser um lugar melhor um dia. Nunca foi o objetivo da vida, suar o rosto sem ver aquela sua luz linda, especialmente quando sorri assim para mim, todo o esforço que se justifica então. Não nascemos para isso, não somos isso. Nossa natureza reclama mais, exige mais, oferta um Éden negado ao assim sermos. Trabalho não é opressão. É liberdade, construção, o que eu faço com paixão e não na solidão. Cada espaço do meu corpo é mais valia, de uma cifra que não aguenta a agonia, de perder a vida sem vivê-la então. Trabalho não é isso não.
Mas a vida também não é isso. Abrir os olhos para a mãe que nos sorri, logo nos primeiros instantes do sopro da vida, é mais que o ganhar o pão de cada dia. A vida é um milagre, não de Deus, mas da existência nossa diária, de buscar a graça, mesmo depois de apanhar um pouco da lotação e do patrão. O sol queima, mas o que arde está por dentro, um grito sufocado da história que nos escuta e registra: podemos mais. Uma greve por humanidade preciso é. Protestar por ser é a bandeira, de todas as cores, vermelha porque meu sangue é assim. O teu é também? Claro que é, companheiro e companheira. Camaradas!
O mundo poderia ser diferente. Wall Street deveria parar um pouco, ouvir um pouco de samba de novo, rir de si mesmo, do touro bobo que enfeia a cidade. De metal bastam as armas. Prefiro o invisível de amar, instrumento que desarma qualquer alma armada, exército que baixa a guarda imediatamente se tu lanças a semente. A semente que me diz que não é possível viver sem você. Pa ra ra, parara rara ra, para ra rara. Paaaa parara paraaaa, paraaaaa ra, paraaaa raaa. Paraaaaa. Refrão de uma música que tento compor para ti. Para lhe amar assim. É o que eu escuto aqui. Coração que não interrompe seu ritmo. Sinfonia da paixão. Poesia do dia.
O mundo poderia ser diferente. Não digo plano, como alguns incautos sugeriram. Prefiro ele redondo, pois, para girar fica mais fácil. É uma mão na roda, sabe? Deve ter tido algum tipo de inteligência quando da sua construção. Sendo filhos da terra, uma medida de inteligência devemos ter. O pensamento deve povoar nossa mente. Um pensamento para um mundo melhor. Mais bonito, justo e amigo. Divertido. Eis a regra a fundamentar toda a teoria constitucional dos povos. Princípio a reger as repúblicas, as políticas públicas, todo o universo de direitos então. Os povos se uniriam, trariam sua fantasia, multicultura de todos os tons na confraternização. Com fraternização, irmãos.
Nós poderíamos ser diferentes. Somos iguais, de carne, osso, suor, choro e despedidas de amores que se foram. Boletos atrasados, financiamentos inapropriados, discussões sem razão, um menino ou menina perdido na multidão. Somos iguais, desconhecidos mas amigos, se eu lhe abro um sorriso e você estende sua mão. Somos iguais, a lágrima é água, um sabor salgado, uma dor que só você conhece então. Mas eu também partilho dela, já sofri por esta, chamo a minha de tempestade de verão. Só não tenho o trovão, pois, a ventania me acompanha, me leva na sanha, de partilhar contigo o universo que é imensidão. Sou mais um Dom Quixote, que acredita em sorte, que as coisas um dia melhorarão. Mas o mundo poderia ser diferente. Poderíamos ser diferentes, sendo iguais, irmãos.
Caminho por essas letras e falo por elas aos amigos que longe de mim estão. O poder da escrita logo se dissipa, na utopia de mudar o topo da ilusão. Mas insisto em ser, de tentar desenvolver, a mais louca teoria de viver, sem esses dias que não foram então. Eles ainda são. Consigo sentir eles daqui, quando não ouço partir, os passos teus que retornam na minha direção. O mundo poderia ser diferente então. Partilha comigo essa maestria, de entregar a alegria, pelos meandros da vida, curvas as quais me perco então.
O mundo poderia ser diferente, sim. A alquimia de uma bruxaria a habitar em mim. A partilha infinita que é ser ….
Exageradamente humano então…