MP pede a suspensão de leis e obras de chacreamentos em Valadares

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MP pede a suspensão de leis e obras de chacreamentos em Valadares
Valadares tem mais de 20 chacreamentos irregulares em andamento. Imagem: Reprodução/Internet

Uma ação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) pode derrubar uma série de atos da Prefeitura e da Câmara Municipal de Governador Valadares que vêm possibilitando a ampliação desordenada do perímetro urbano e proporcionando um aumento muito grande de chacreamentos fora do padrão mínimo exigido pela legislação federal.

A ação civil pública foi impetrada em maio, em virtude de uma denúncia feita ao MP em 2021, pelo advogado e ativista de controle social Guilherme Jacob de Oliveira, na qual leis eram alteradas e aprovadas para permitir, de forma irregular, a criação de empreendimentos na zona rural que, posteriormente, seriam integrados ao perímetro urbano através de mera aprovação administrativa.

Agora o MP busca, na Justiça, a anulação das leis que passaram a admitir a criação de chacreamentos na zona rural de Valadares. Por conta de alterações ilegais na legislação promovidas pelo atual governo, com o apoio da Câmara de Vereadores, as pessoas que já adquiriram terrenos nestes lugares correm risco de ficar no prejuízo.

Situação

Segundo a ação do Ministério Público, as modificações feitas pelo Executivo e Legislativo passaram a permitir a divisão de áreas rurais em chácaras de tamanho mínimo de até 1 mil m2, inferior ao denominado “módulo rural”, que é de 20 mil m2 (dois hectares), estabelecido nas normas gerais de direito urbanístico como o tamanho mínimo para a criação de chácaras.

Com isso, brotaram dezenas de chacreamentos em Valadares, onde, atualmente, já existem pelo menos 20 deles em execução de forma clandestina. Isso porque desde a criação das leis, a Prefeitura não publicou decreto regulamentando o procedimento de aprovação de chacreamentos, o que impossibilitou a aprovação de projetos, levando empresários do ramo a iniciar obras mesmo sem autorização administrativa dos setores competentes.

A denúncia feita em 2021 pelo advogado e ativista Guilherme Jacob se deu depois que ele detectou sucessivos aumentos no tamanho do perímetro urbano sem a realização de estudos técnicos e projetos exigidos pela legislação federal, ocasião em que identificou, também, a apresentação de proposta de lei pelo prefeito de Governador Valadares, André Merlo (PSDB), para autorizar a criação de chacreamentos em desacordo com leis federais.

Uma das alterações no perímetro urbano se deu pela Lei Complementar Municipal nº 243, publicada em 30 de abril de 2019, que passou a prever a possibilidade de se autorizar construções na zona rural que seriam integradas ao perímetro urbano por meio de mera aprovação administrativa pela Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan).

Posteriormente, em 2021, o Executivo propôs um projeto de lei visando alterar a organização até então vigente na zona rural, o que resultou na publicação da Lei Complementar nº 275, que passou a permitir a divisão do solo rural para a criação de chácaras por meio de condomínios de lotes fora do perímetro urbano, ou seja, autorizando a criação dos chamados “chacreamentos” que, depois de aprovados, passariam a integrar o perímetro urbano.

Para o advogado, a administração municipal criou uma verdadeira espécie de perímetro urbano flexível, a partir da autorização de novos empreendimentos de divisão do solo que ultrapassem o perímetro urbano, com a consequente ampliação deste perímetro, em contrariedade à Lei Federal n. 10.257/2001.

Ainda conforme a denúncia, com a lei que autorizou a criação de chacreamentos “houve uma deturpação dos sentidos [das leis federais] para permitir a instalação de loteamentos dissimulados de chacreamentos na zona rural, fomentando a expansão horizontal desordenada da cidade sem o correto processo de planejamento e sem que os empreendedores sejam efetivamente cobrados pela infraestrutura mínima dos empreendimentos”.

Isso, além de também contribuir indiretamente para a insustentabilidade econômico-financeira do sistema de transporte público, que passaria a atender percursos mais longos.

Apuração

A partir da denúncia, o Ministério Público instaurou inquérito civil para investigar as irregularidades apontadas pelo advogado, concluindo a apuração na segunda quinzena de maio, quando ajuizou ação civil pública contra as alterações na legislação feitas pela Prefeitura e Câmara Municipal, ambas colocadas como rés na ação.

De acordo com a ação do MP, o Município editou as leis complementares municipais 243/2019 e 275/2021, sem observar as normas expressas na Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), que é a norma geral de desenvolvimento urbano, de ordem pública e interesse social, e, também, a Lei Federal 6.766/1979, que regula a criação de loteamentos.

O MP apontou também que “as referidas leis municipais permitiram a alteração do zoneamento por meio de ato administrativo infralegal, da Secretaria Municipal de Planejamento, violando outras disposições gerais federais que disciplinam a alteração do zoneamento e que exigem a edição de lei formal para tal fim”.

Na ação, o órgão apresentou ainda um parecer técnico assinado por uma arquiteta e urbanista da Coordenadoria Estadual das Promotorias de Justiça de Habitação e Urbanismo, sediada em Belo Horizonte, que atestou as ilegalidades das alterações feitas pela Prefeitura e Câmara de Valadares.

De acordo com o parecer técnico, a situação vai contra a Lei Federal n. 6.766/1979, que estabelece, no artigo 3º, que a divisão do solo para finalidades urbanas, como habitação por loteamentos, só é permitida em zonas classificadas como urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica.

Tais áreas, no entanto, precisam estar definidas no Plano Diretor ou aprovadas por lei. Além disso, no caso de leis que aumentem o perímetro urbano do município é necessário,  antes, elaborar um projeto específico, definido no artigo 42-B do Estatuto da Cidade, e a apresentação da proposta para avaliação e discussão com a população.

Violação à gestão democrática da cidade

Na mesma ação, o Ministério Público afirmou que os projetos de lei “foram apresentados à Câmara Municipal sem a realização de debates, audiências e consultas públicas, vício que permaneceu durante a tramitação dos processos legislativos respectivos, de forma que os aspectos técnicos e impactos no território municipal como um todo não foram discutidos”.

Em razão disso, o MP concluiu que, “ao aprovar as Leis Complementares Municipais 243/2019 e 275/2021, que ampliaram o perímetro urbano e alteraram o zoneamento municipal, sem a realização de audiências públicas, o legislador municipal rompeu com a democracia participativa, violando a Constituição da República, o Estatuto da Cidade e as Resoluções do Conselho Nacional das Cidades”.

Medida Liminar

Para frear as ilegalidades apontadas, o Ministério Público requereu ao Poder Judiciário uma medida liminar determinando a suspensão das leis complementares municipais 243/2019 e 275/2021 e a suspensão de todos os atos administrativos, licenças, autorizações e aprovações eventualmente concedidas com base nas leis.

Também foi solicitado que o Executivo “se abstenha de aprovar quaisquer projetos de parcelamento do solo e construção civil, bem assim licitar quaisquer obras públicas ou concessões no perímetro urbano ampliado” pelas leis complementares e alterações de zoneamento e “se abstenha de encaminhar projetos de lei que visem a alterar do perímetro urbano ou do zoneamento municipal, em desacordo com o que determina a Constituição Federal, o Estatuto da Cidade, a Lei 6.766/1979 e demais normas referidas, sob pena de multa diária”.

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