Nascer em Ipatinga talvez não tenha sido uma escolha minha, mas sinto muito orgulho por isso ter acontecido. Assim como tantos outros moradores, o que trouxe meus pais para o município foi a promessa de desenvolvimento aliada à qualidade de vida que uma cidade de interior proporciona aos seus moradores.
Parte da minha infância e juventude vivi o entusiasmo coletivo da população com as ações que projetaram nossa cidade e região ao cenário nacional. A criação da Região Metropolitana do Vale do Aço sela este tempo possibilitando o desenvolvimento de ações integradas para enfrentar desafios que já não eram de uma cidade somente.
Tudo era muita novidade. Os projetos na educação pública, da qual inclusive permitiu minha formação, as obras projetadas com o inconfundível ar futurístico presente nos traços de Burle Marx, as iniciativas culturais que marcaram apresentações nos teatros e nas ruas, o parque Ipanema, o futebol e o Kart aos domingos.
Sem dúvida nenhuma, viver aqui era sinônimo de poder desfrutar de uma prosperidade que acontecia a todo momento. Ipatinga se encaixava perfeitamente naquilo que descreve a música “Além do Horizonte”, de Roberto Carlos.
Quero ressaltar, porém, que esse não é um texto saudosista. Como jovem que sou, não posso dizer que sinto saudades daquela Ipatinga. De fato era um tempo muito bom, mas precisamos entender que aquele tempo já não existe mais.
E quando por vezes tentamos voltar ao passado, as realizações não aconteceram com o mesmo vigor que antes. Isso só reforça a velha máxima de que o tempo é uma das coisas da vida que realmente não volta.
Ipatinga completa hoje *29), 57 anos de emancipação. Foto: Elvira Nascimento
Uma conjunção perfeita, mas que com as mudanças sociais e econômicas, se mostrou insuficiente e acabou se esgotando na medida em que as necessidades da população também passaram por transformações.
Temos de convir que com as mudanças na legislação trabalhista, as crises econômicas que já se arrastam há anos, e as disputas internas no comando da empresa, o que afetou sua política de trabalho, a USIMINAS já não é mais o sonho de consumo do jovem que aqui vive.
Ou seja, por mais que estejamos reféns economicamente da produção e dos empregos gerados pela empresa, constatarmos que a siderurgia não é mais a única vocação econômica do município é um dado relevante no planejamento de políticas públicas que visem a superação daquele tempo do qual digo não ter saudades.
Um levantamento publicado pela conceituada fundação João Pinheiro, em julho do ano passado, revela que nossa cidade teve sua participação no PIB de Minas Gerais diminuída de 2,14% em 2010 para 1,68% em 2017, principalmente em função da retração na metalurgia e na fabricação de produtos de metal, inclusive máquinas e equipamentos.
Além disso, neste mesmo período também acumulamos perdas expressivas em contribuição para a indústria na região, na participação no setor de serviços e na administração pública em nosso estado.
Essas são apenas algumas das constatações candentes à realidade que hoje vivemos. Mas afinal, como nos acomodamos em não pensar o futuro? Talvez a empolgação dos resultados conquistados a curto prazo tenha entretido aqueles que tinham por obrigação apontar as condições que garantissem o crescimento de nossa cidade e da região, não de forma temporária, mas com base sólida, permanente e sustentável.
Muitas vezes, é justamente por desconhecer a centralidade imposta nos desafios, que acreditamos em soluções fáceis para os complexos temas que atualmente permeiam a administração pública.
A decadência social, econômica e política que hoje se abate em Ipatinga está expressa naquilo que domina a agenda nacional. A condução do combate à pandemia da COVID-19, acentua os impactos negativos de uma política negacionista, dominada pelo ódio ao pensamento crítico e ao saber científico.
Com isso, os espaços existentes nas instituições para elaboração e avaliação das políticas públicas municipais, já não são mais suficientes para apontar um caminho seguro que tenha como diretriz principal o tripé da sustentabilidade: uma cidade ecologicamente correta, economicamente viável, socialmente justa e culturalmente diversa.
Todos estes aspectos responsabilizam-nos a pensar a Ipatinga de hoje, com a sensibilidade capaz de potencializar as vocações existentes no município e investir no surgimento de novas vocações, como forma de estabelecer outros ciclos econômicos capazes de consignar um crescimento que seja aliado ao desenvolvimento social. Um passo que precisa ir além da boa fé que embalou os sonhos daqueles que ajudaram a construir Ipatinga até os dias de hoje.
Envolve sobretudo a ousadia em garantir a linearidade de políticas públicas, para que elas ultrapassem a propriedade dos governos e sejam vistas como metas que devem ser cumpridas por todos e todas que estão comprometidos com um futuro já em andamento.
Por fim, para de fato comemorarmos a chegada dos 57 anos da nossa cidade, é preciso nos aprofundarmos em reflexões honestas sobre o caminho que nos trouxe até aqui. Com tantas contradições não se trata mais de saber “Para onde vai Ipatinga?” mas sim “Para onde foi Ipatinga”.
Ainda que nos custe verdades não palatáveis, é inconcebível permanecermos no âmbito dos poderes que hoje conduzem a cidade, com a tentadora superficialidade que não aponta soluções aos problemas estruturais que fizeram com que aquela grande Ipatinga infelizmente ficasse no passado.
*Atualmente é Estudante de Administração Pública pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro e bolsista de Iniciação Científica do Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD-FACE/UFMG); Foi Vereador Mirim pela Câmara de Ipatinga 2009-2011, Conselheiro Municipal de Juventude de Ipatinga 2013-2015, Membro Titular do Fórum Regional de Governo do Vale do Aço 2015-2018 e Estudante de Políticas Públicas pela Universidade Federal Fluminense 2016-2020.