O fim de uma gestão sem legado: os anos perdidos de Governador Valadares

0
898
O fim de uma gestão sem legado: os anos perdidos de Governador Valadares
Em seu último ato como prefeito, André Merlo realizou a cerimônia de inclusão de seu retrato na Galeria de Prefeitos do município. Imagem: Divulgação

No dia 31 de dezembro, Governador Valadares viu chegar ao fim o mandato de André Merlo (União Brasil), amplamente considerado um dos piores prefeitos da história recente da maior cidade do leste de Minas.

Após oito anos à frente da administração municipal, Merlo deixou a prefeitura sem realizar nenhuma obra de impacto ou serviço significativo que pudesse ser associado ao seu nome, encerrando sua gestão de forma que poucos cidadãos lembrarão dela com apreço.

A pergunta que fica é simples: qual grande legado André Merlo deixou? A resposta, invariavelmente, é nenhuma.

Merlo, que foi o segundo prefeito a ser reeleito na história da cidade, após a ex-prefeita Elisa Costa (PT)  – 2009/2012 e 2013/2016 -, assumiu em 2017 com ampla maioria na Câmara Municipal, o que lhe garantiu poder para aprovar ou rejeitar projetos de acordo com suas conveniências.

No entanto, sua gestão de oito anos gerou descontentamento geral, e o resultado veio nas urnas em 2024. Dos 19 vereadores governistas, apenas 7 foram reeleitos, enquanto nomes tradicionais da política local e apoiadores de linha de frente do Executivo, como Regino Cruz, com oito mandatos, e Paulinho Costa, com seis mandatos, foram rejeitados.

Além disso, o candidato a prefeito apoiado por André Merlo, Renato Faga, também não conquistou a confiança do eleitorado, e acabou em terceiro na disputa.

Descrita por muitos como uma administração “arroz com feijão”, a gestão Merlo limitou-se a ações cosméticas: reformas de praças, pinturas de meio-fios, construção de rotatórias. Inovação e renovação ficaram ausentes, assim como o diálogo com as diversas classes e entidades da sociedade civil, incluindo aquelas que outrora o apoiaram.

O ex-prefeito também entregou à iniciativa privada, com muito pouca discussão com a sociedade, patrimônios valiosos do município, como o SAAE e, mais recentemente, a Açucareira, o que intensificou as críticas contra ele.

Cabe destacar que a concessão da autarquia, até o momento, não trouxe melhorias perceptíveis para os cidadãos e contribuintes. A falta de água continua recorrente, os vazamentos de esgoto persistem em vários bairros da cidade, enquanto as cobranças mensais seguem pontuais, independentemente da precariedade dos serviços prestados.

Os R$ 395 milhões obtidos com a concessão reforçaram os cofres municipais, mas uma parte significativa desses recursos foi rapidamente gasta, muitas vezes de forma desordenada, com asfalto sendo aplicado sobre vias já pavimentadas. Mas isso é caso para ser apurado pelo novo governo.

Entre os compromisso de campanha que não foram cumpridos, está a implementação da captação alternativa de água por meio da Fundação Renova, medida prometida como compensação pelos danos do rompimento da barragem de Mariana, em 2015. Iniciada em 2018, a construção da adutora no Rio Corrente Grande foi anunciada como concluída em 2023, mas a água dessa fonte ainda não chegou às torneiras dos valadarenses.

Uma das promessas mais notórias de André Merlo, romper o contrato com a Empresa Valadarense de Transporte Coletivo, agora Mobi Transporte Urbano, também foi deixada de lado. Alegando entraves contratuais, Merlo não deu continuidade a esse compromisso que tanto havia enfatizado durante suas campanhas de 2012 e 2016.

Sua gestão também ficou marcada por falsas declarações. Em 2018, Merlo anunciou que 20% do esgoto da cidade estavam sendo tratados pelo SAAE – informação rapidamente desmentida pelos fatos. Além disso, não houve qualquer política consistente para enfrentamento ao uso de drogas ou para cuidar da crescente população em situação de rua ou preservar os patrimônios históricos do município.

Politicamente, Merlo colecionou rupturas. Ele não apenas rompeu com seu primeiro vice-prefeito, Luciano de Oliveira, e desfez a aliança com seu segundo vice, David Barroso, como também cortou relações com um de seus principais aliados de primeira hora, o deputado federal Hercílio Diniz (MDB).

A incapacidade de manter parcerias estratégicas marcou sua trajetória. Obras e serviços prometidos ficaram pelo caminho, muitas delas iniciadas e jamais concluídas, consumindo recursos públicos e reforçando a imagem de uma gestão ineficaz e perdulária.

A precariedade das políticas públicas da administração de André Merlo foi especialmente sentida nas áreas de infraestrutura e saúde. O abandono da periferia ficou evidente com ruas esburacadas e frequentes cortes no abastecimento de água.

Na saúde, a situação foi agravada por escândalos como o desvio de medicamentos do Hospital Municipal, a descoberta de pagamento irregular de horas extras a médicos, conforme apontado pela Polícia Federal, e o eventual desvio de verbas destinadas aos agentes de combate a endemias (ACE) e comunitários de saúde (ACS).

O prefeito também teve seu nome envolvido em denúncias graves de corrupção, incluindo o suposto esquema de propina relacionado às obras do aeroporto e outras irregularidades na administração reportadas pelo deputado federal Hercílio Diniz.

Em 2018, ele foi alvo de um pedido de cassação de mandato feito por um estudante de direito, após a veiculação nas redes sociais de um áudio no qual Merlo tentava coagir o então vereador Jacob do Salão a apoiar seu candidato à presidência da Câmara.

Em 2019 e 2020, protagonizou uma polêmica tentativa de permuta envolvendo diversos terrenos públicos, incluindo áreas verdes e institucionais, em troca de um único terreno no bairro Planalto.

Inicialmente, o objetivo declarado era a construção de um novo fórum; posteriormente, a justificativa mudou para a edificação de uma nova rodoviária. No entanto, a iniciativa levantou suspeitas de que o verdadeiro propósito era beneficiar interesses da iniciativa privada, e em ambas as situações a Justiça precisou intervir.

Após oito anos de promessas descumpridas, relações políticas conturbadas e uma administração amplamente criticada, o ciclo de André Merlo chegou ao fim, deixando um saldo de decepção em Governador Valadares e confirmando a avaliação de que seu governo foi marcado mais por propaganda enganosa, como ainda podemos ver nos outdoors e jornais espalhados pela cidade, do que por realizações concretas.

Como bem expressou o colunista do O Olhar, Darlan Corrêa Dias, em seu último artigo, Cartas Para Papai Noel: Só queria pedir que o senhor faça nossa cidade ser igual a dos outdoors que o prefeito careca mandou espalhar pela cidade: Valadares a cidade da educação, a cidade da saúde e a cidade da mobilidade… Se essa fantasia se concretizar, vamos ser os cidadãos mais felizes do país!”

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

3 × 2 =