O Som do Silêncio

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O SOMDO SILÊNCIO
Imagem: Divulgação

Dedilha a mim este acorde, amigo, prometo que não vou chorar…

Assim comecei um dia no tempo. Com algum desalento, pensei sobre o que vivi até aqueles minutos à súplica da amizade. Tive coragem, saudade também, de dizer ao companheiro o quão derradeiro é o gasto da maior riqueza que temos. Não é o capital, para lá de mal, a qual adoramos como bezerro de ouro. É de dor, ao constatar que foi, o relógio da vida a ser o tesouro maior. Um dó menor foi por ele tocado.

Segurei as lágrimas e ele a palheta, no que continuei a treta de a dois amigos, as confidências continuarem. Lembrei da juventude, e de uma falsa astúcia, de acreditar que as posses nós temos. Ao dinheiro, fama, poder, riquezas que nos contam, não sendo um conto de fadas, acreditamos ser isso a verdade de uma homilia de domingo. Isso eu rezei sozinho, no coração apertado, ao lembrar ao amigo que cantava comigo, a canção do que fui até ali. Troquei a segunda-feira por um ponto no trabalho, a terça-feira ao encontro adiado, a quarta pela agenda compactada, a quinta pela viagem longe de mim, a sexta para desconhecidos me aplaudirem, e no fim da semana, o final não veio. Tudo era um looping de recomeços, onde adeuses eu esqueci. Um solo dele sobreveio, ao que às águas dentro de mim não deu um jeito, de impedir a tempestade em meio ao oceano aberto que me confluía. Ele continuou o acorde. Um sol sustenido maior foi. E segui, pois.

Um casal de namorados passou por nós, um jovem olhou a beleza de um par de olhos verdes da garota a fitá-lo, e deixei esse tempo vagarar em mim. Não deixei de admirar, no que meu amigo ficou a observar, a beleza da simplicidade de um amor correspondido. Nisso fiquei menino, ao lá menor do companheiro, que jogou a corda do violão para a paixão neles ficar. Meus olhos dialogaram com os do garoto, dando a mensagem de não permitir nenhum pressuposto, onde se troca tempo por moeda. É preciso mais festa, foi o recado. Fica agora nessa, namorando ela e a vida que por suas veias passam nesta hora, no ímpeto e tempestuoso das emoções que vigoram. Revigoram… Eles foram passear. E o meu mar mais salgado ficou.

Mas não quebrei a promessa e franzi a testa, para o clima não mudar. Meu amigo fez a leitura, da expressão no meu rosto que queria a cura, e se pôs a tocar um acorde alegre. Ao conjunto de notas tocadas, a sensibilizar a primeira, após a terceira e a quinta nota de uma escala maior, o refrigério veio e me equilibrei. Percebi que vida recuperei, e em um existir apostei, de não deixar que o destino jogue as cartas por mim. Compreendi o jogo, de tudo que nos cerca, da corrida do nascer ao findar, que este intervalo é o hiato a celebrar. Falsos deuses não cumprem promessas, mas insistem na certa, de a nós convencer acumular riquezas por todo o por vir. Agora quero rir, no templo da perdição, e não mais chorar, pois no balcão da existência vou descartar tudo que não passa pelo buraco da agulha. Essa foi a fagulha, dentro de minha alma, a mostrar aos outros que diferente eu era agora. Sandice disseram, tribulações vieram, e som de trombetas meu amigo reverberou no violão. Eu era uma erupção. Milagre de uma ressurreição eu fui.

Agora senhor de mim, cumprimentei por fim, o maior de todos os deuses. Cronos, infinito, eterno, como já disseram, o Tempo nos tem. Esta divindade assiste a tudo, testemunha o mundo, como somos prolixos em desperdiçar a dádiva que Ele nos entrega. Jornada de trabalho, cartão de crédito no suplício, horas extensas na estrada, são os registros de seu mecanismo cósmico que acompanhou o que fomos. Natureza perdida, ao compreender que a via era dizer não a tudo aquilo. Jornada na família, crédito na paixão que vinha, horas demoradas nos ponteiros do relógio na namorada despedida, extensa estrada que só espera retornar para casa, era o que Tempo queria. Dizia, a cada tic tac de uma Aurora ao Jardineiro cuidar, das flores que nasciam ou morriam, a depender da escolha que fazíamos. Somos mais que isso, vida que grita dentro da gente para mudar.

Dessa vez quem quebrou a promessa foi meu amigo ao violão. E eu acompanhei seus rios, lágrimas de um curso que não era sozinho, nos meandros de sentimentos jorrar. Ele dedilhou algumas notas, lembrou da hora, e fez tocar sua última canção antes de partir. Alguém estava para vir. Disse a ele que amor foi o que ele teve, na criança que choraria em breve. Ele não se aguentou, e o Tempo testemunhou, a música que foi tocada no violão por ele. Tocada pelo coração. Na linguagem do Cronos, no infinito e eterno sagrado, aquele instrumento foi tocado, exprimindo toda a verdade contida em um som melodiado assim: “Amor eu vou para casa, pode esperar, pois, depois dessa música, vou querer apenas escutar…

o som do silêncio que canta por não demorar.”

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