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Sorrindo o leite derramado

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A esbaforida

Ela entrou esbaforida! Empurrando o carrinho duplo – sim, eram gêmeos! Atrás dela veio um time: pai, avó materna, uma amiga e Zizi, a irmã mais velha!

Minha sala era aconchegante, mas não muito grande… Logo senti que aquela consulta ia ser inesquecível!

Aline (a mãe), muito simpática, entrou se desculpando:

– Desculpe a confusão doutor… mas parece que eu esqueci tudo do tempo da Zizi! Também, como se preparar pra ter gêmeos!

Não tive tempo de responder, Dona Eulália (a avó) logo emendou:

– Ainda bem que EU estou aqui, não é mesmo?

Quando eu ia abrir a boca, Lucia (a fiel amiga) disparou:

– Ah, doutor, como é bom estar aqui! Agora o senhor vai passar uma mamadeira e vai voltar a paz nessa família!

Eu me arrepio quando ouço a palavra mamadeira! Mas nem tive tempo de responder. Afrânio (o pai) estava ajudando Zizi a pescar um peixinho dourado do meu aquário com as mãos!

Respirei fundo e, com muito jeito e carinho, pedi que todos saíssem e só ficassem Aline, os bebês e um acompanhante – à escolha dela. O resto voltaria pra recepção. Após alguns segundos de mal-estar, Aline entendeu o recado e dispensou o marido e a amiga palpiteira, pedindo que eles cuidassem da Zizi, à qual “comprei” com um beijinho e um balão vermelho…

Então a consulta começou de verdade!

Os gêmeos (Paula e Bebeto) estavam com dois meses. A família não dormia há exatos sessenta dias!

A avó tinha certeza que o leite de Aline era fraco!

Procurei ficar tranquilo e não hostilizar a simpática senhora… Após muita confusão, já que mãe e avó insistiam em trocar as informações (“foi a Paula que golfou”, “foi o Bebeto que fez cocô verde” … Depois invertiam as informações…).

A duras penas consegui colher uma história razoável dos gêmeos!

Então pedi para examiná-los!

Nova confusão! A implacável lei de Murphy atacou novamente! Ambos fizeram cocô bem na hora do exame físico! E Paulinha ainda golfou em mim durante pesagem…

Consegui concluir o exame físico! Aí veio a maratona das duas para vestir a dupla! Acabou Paulinha golfadora de boné azul e Bebeto de meias rosa…

Então pedi pra Dona Eulália sair com as crianças, o que ela não gostou nada! Olhei nos olhos da mãe (cheios de olheira) e dei uma de Dr. Dráuzio:

– Cansada, né minha filha?

Ela começou a chorar e derramou uma torrente de queixas (Afrânio não ajuda, Dona Eulália não cansa de dar palpites, Zizi morre de ciúmes…). Deixei-a desabafar, levantei-me, dei um longo abraço e mostrei minhas anotações. Os bebês haviam crescido muito! O que queria dizer que o leite dela estava ótimo! Ela precisava era de colo!

Chamei a família, expliquei o que estava acontecendo. Me comprometi a ver os irmãozinhos uma vez por semana, até tudo ficar bem. Pai, avó e amiga saíram contrariados! Aline saiu empoderada!

Uma semana depois, Aline voltou com outra cara! Mais arrumada, organizada e comandando a família! Paula e Bebeto ganharam mais peso ainda e Zizi parecia mais tranquila.

– Sabe, doutor, a gente às vezes precisa só de um abraço…

** Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do O Olhar.

 

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