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QUE GOSTO TEM O UMBU?

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QUE GOSTO TEM O UMBU?
Foto: Divulgação

Coluna Sorrindo o leite derramado

Da manga rosa quero o gosto e o sumo
Melão maduro, sapoti, juá
Jaboticaba, teu olhar noturno
Beijo travoso de umbu, cajá
Pele macia, é carne de caju
Saliva doce, doce mel, mel de uruçu
Linda morena, fruta de vez temporana
Caldo de cana caiana
Vou te desfrutar
Linda morena, fruta de vez temporana
Caldo de cana caiana
Vó te desfrutar

Morena tropicana
Eu quero teu sabor…

Arrisco-me a dizer que mais de 90% dos pertencentes à geração Z não conseguem entender a letra da deliciosa canção “Morena Tropicana”. Não porque, como diz o colunista Leonardo Sakamoto, exista um grave problema de interpretação de texto nos dias atuais.

Eu concordo com ele! Há sim uma crise na capacidade das pessoas entenderem os conteúdos do que leem, mas isso não é só dos jovens da geração Z, infelizmente, com a popularização da Internet, a superficialidade das redes sociais, a velocidade com que a informação circula, as pessoas se desacostumaram a ler e compreender textos.

Daí a falta de interpretação de textos assola vovô, papai e filhinho… mas não é disso que eu estou falando! Estou me referindo a outra triste agrura dos tempos modernos: o problema é que, para eles, a letra de “Morena tropicana” não faz sentido porque eles não conhecem frutas!!! Sapoti, juá, umbu, cajá e cana caiana… Talvez nem nunca tenham ouvido falar da abelhinha uruçu!

E, se não conhecem, como se identificar com os sentimentos que a canção do Alceu provoca? Como querer provar o gosto e o sumo do beijo da morena? Como se apaixonar pelo matreiro olhar de jabuticaba da moça? Como desejar acariciar a pele macia como carne de caju da sedutora morena? Eles nem imaginam que dá pra comer a fruta “de vez”, ou esperar ela ficar madura… Eles simplesmente acham os versos bizarros! Pois descrevem uma atividade para eles desconhecida: comer frutas!

Ai, ai! Quanta coisa esses meninos estão perdendo! Como diria o grande Lupicínio:” Esses moços, pobres moços!…”.

E, caro leitor, a treta não é só a pouca cultura alimentar – que já seria triste! -, o problema é que a geração Z não conhece e não consome frutas. Foram criados no asfalto, morando em apartamentos e sem tempo para brincadeiras na rua. Nunca pularam o muro do vizinho pra roubar mangas, nunca subiram numa árvore! Como saberiam o gosto travoso do umbu? Ao contrário de seus avôs e avós, que subiam em todas as árvores frutíferas e podiam entender os belos versos de Alceu Valença.

A grave consequência dessa desinformada geração é um triste panorama nutricional. Em meu consultório presencio um desfile de adolescentes com inúmeras carências de vitaminas e sais minerais. Todas as semanas eu recebo exames de pacientes com níveis preocupantes de vitamina C, ferro, zinco… Quando eu explico que os exames estão alterados devido ao erro alimentar, eles ficam quase que ofendidos. Alguns se negam a comer frutas, como se fosse um enorme sacrifício!

A geração Z deveria ser privilegiada, pois convive com inúmeros avanços tecnológicos – e hoje, a vida no planeta é mais fácil devido a esses avanços -, mas acaba sendo uma geração sacrificada, pois é bombardeada por propaganda e consumo, tem uma oferta exagerada de alimentos industrializados, dedetizados, aromatizados e cheios de gordura trans… vive em cidades poluídas e com pouca área verde e seguem uma agenda diária sufocante (com tantos compromissos quanto a de um CEO da avenida paulista).

O resultado são meninos obesos, com dislipidemia, fissurados em telas e com a vitamina C baixíssima. Ou magrelos, que só pensam em ir para academia ”pegar músculos”, turbinados com whey e creatina… Ou meninas que se entopem de comida “gostosa” e depois vomitam…

Termino lembrando os versos de outros dois gigantes da MPB, Ivan Lins e Vítor Martins:

Perdoem a cara amarrada
Perdoem a falta de abraço
Perdoem a falta de espaço
Os dias eram assim
Perdoem por tantos perigos
Perdoem a falta de abrigo
Perdoem a falta de amigos
Os dias eram assim
Perdoem a falta de folhas
Perdoem a falta de ar
Perdoem a falta de escolha
Os dias eram assim
E quando passarem a limpo
E quando cortarem os laços
E quando soltarem os cintos
Façam a festa por mim
Quando largarem a mágoa
Quando lavarem a alma
Quando lavarem a água
Lavem os olhos por mim
Quando brotarem as flores
Quando crescerem as matas
Quando colherem os frutos
Digam o gosto pra mim

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